terça-feira, dezembro 09, 2003

Confesso...

Confesso que me sinto um pouco constrangido. E até arrependido, por que não dizê-lo !
Fiz juízos de valor precipitados, presumi processos de intenções menos claros, vislumbrei sórdidas manipulações a torto e a direito, vasculhei zonas obscuras e alienantes onde, afinal, só havia clareza e a mais límpida transparência ...mas, que dianho ( como dizia a minha avó materna, quando as coisas lhe não iam de feição !), tudo apontava para que eu julgasse não andar tão longe da verdade. Toda a gente escreve: são políticos e são ex-políticos, são cabos de guerra e são ex- cabos de guerra, são analistas políticos e são analistas da guerra, são os psicólogos e os para-psicólogos , são os jornalistas e os que sendo jornalistas são também correspondentes de guerra, são os treinadores de futebol, são os jogadores, são os e as que escrevem futilidades e vivem dessas futilidades para aparecerem nas bancas das livrarias ou nos escaparates dos hipermercados... ( de vez em quando lá aparece, um pouco envergonhado, misturado nesta amálgama editorialista pseudo- liiterária, um verdadeiro livro a sério!) , toda a gente escreve, dizia eu e como sou um pouco céptico em relação à fartura ( quando a esmola é grande o pobre desconfia, não é? ), comecei a achar que devia tratar-se de gato escondido com rabo de fora... Como fui injusto, meu Deus!
O mesmo se passou com os comentadores: é claro que desconfiei, quando vi políticos ( da direita à esquerda, mais os primeiros, em abono da verdade ) a tecerem comentários a propósito de tudo e de todos. Na rádio, na televisão, nos jornais, nas revistas da especialidade e sem ser da especialidade, os comentadores opinam sobre todas as coisas, analisam todos os eventos, dissecam ao ínfimo pormenor as incidências de qualquer processo, nacional ou estrangeiro, longe ou perto do poder, dentro ou fora da sua especialidade, numa magnitude enciclopédica que aturde, que embriaga, que esmaga...
Mauzinho, eu, que havia de pensar?! Nesta lufa-lufa de escrita e comentário, nesta corrida louca contra o tempo e contra os outros, dei comigo a magicar nos interesses ocultos que deveriam estar por detrás de tanta azáfama. É que agora não é só a febre dos sábados à tarde de antigamente, é a loucura, a excitação febril de todos os dias da semana, de todas as horas, de todos os minutos, de todos os segundos... Seria a paranóia do dinheiro no mundo consumista e louco em que vivemos? Seria a ilusória e narcisista vaidade de querer ser alguém, uma hora, um minuto que seja? Que mistérios profundos e insondáveis se escondem por detrás deste exibicionismo despudorado e cego?
Mas, de repente, fez-se luz no meu espírito ! E daí o meu arrependimento já manifestado. Aqui não há sofreguidão, não há ganâncias, não há interesses políticos obscuros nem a cúpida avidez pelo dinheiro, atropelando tudo e todos, eximindo-se a impostos e demais contribuições...Tudo é límpido e sereno...
No fim de contas, é tudo por uma boa causa. Políticos, jornalistas, críticos, comentadores, treinadores, jogadores, analistas e escritores, e mais os serventuários e mais os bajuladores, afinal, não andam ‘ ao meu, ao meu ’!
O que estão é todos apenas interessados em contribuir para as instituições de solidariedade nacional, para que a fome e a miséria desapareçam rapidamente da nossa sociedade, para que haja mais paz e justiça social. Querem somente contribuir para que se estabeleça um verdadeiro espírito de natal nos trezentos e sessenta e cinco dias do ano. Se este não for bissexto.
Amen.